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Vou contar-vos o que a MARIA TERESA, no seu livro sobre o qual me tenho debruçado, nos relata sobre o casamento e morte nas Cachinas. Foi aqui que ela com persistência e atenção, estudou a vida, os costumes e a linguagem do pescador de Vila do Conde .
.Do isolamento a que se condenam resulta que os casamentos apenas se realizam entre gente da classe. E como? Oiçamos a tia Beatriz:
- « No sáb´do p´la menhão confessei-me e árrecebi o Sinhor; ispois fomos ó cebile. No oitro dia fomos á Misse às 10 horas e nessa hora nos càsêmos. Lebemos um grande acumpànhamento: à prôua bai a noiba, cum catchiné bránco; logo atrás bai o noibo c´o pádrinho e três ràpázes sorteiros e a seguir o acumpànhamento.
À borta (volta) da Igreja já bem o noibo co´a noiba. Faz-se ó depois à boda di doce que bôu cumprar à doçaria, e binho. Oitros dõu boda de galos e cárnêros e outros de cruongo, raia cum çabolas e prementão... È cònforme ás posses. E, se o noibo é pod´roso, pag´àmitade das despesas. Os pais num n´os dã dote; os meus num me deru tàmanho de nada ».
Quando morre alguém, é costume - o que aliás é vulgar entre o nosso povo - fazerem grandes prantos. As mulheres, quer velhas quer novas, vão todas de«roupa» para a cova, isto é, vestidas de santas. Vai uma , de Senhora de Fátima ou do Carmo, outra de Santa Filomena. outra de Santa Teresinha, conforme a sua devoção ou da família.
O defunto vai sempre de caixão e « si é probe tira-se um peditoro ». Só os homens costumam acompanhar o enterro.
.NOTA - Julgo que esta linguagem que a MARIA TERESA ouviu pelos anos quarenta, na nossa Caxina, já hoje não se ouve, apesar de eu ainda me lembrar de muitos destes "sons"(fonética). Relatei-vos esta minha leitura, pois creio que os mais novos nunca terão ouvido nada do género, mas , também é documental.
6 comentários:
Este belo naco de prosa do linguarejar das nossas gentes do mar, bem merecia ser ilustrado com uma daquelas fotografias do Carlos Adriano, dos tempos em que todo o séquito se dirigia para a cerimónia religiosa a pé.
Cereja
Boas.
Pois muitos ao ler este seu artigo perguntar-se-ão se é outra língua e não perceberão vários termos. Como diz e bem, hoje já não se fala desta maneira, mas ainda persistem muitos termos e tons "bravios" desta linguagem.
É precisamente este falar mais antigo que por vezes vou usando "entre família" nos termos que fui apanhando de avós e pais, mas o que sei é muito pouco, fruto de nunca ter sido pescador e de ter "demasiados anos de escola" :).
Julgo que o mar moldará sempre a linguagem de quem dele vive, tal como o monte molda a do aldeão.
De agradecer ao José a transcrição pura do texto.
Atentamente,
www.caxinas-a-freguesia.blogs.sapo.pt
Exactamente António. A dificuldade esteve na transcrição exacta do texto, pois em cada palavra escrita, eu tinha de verificar se estava conforme o texto, ...Mais fácil teria sido escrever numa língua estranha, diferente, em que alguns erros seriam perdoados, mas esta não, pois é certamente a linguagem de muitos dos nossos antepassados, e assim, não teria qualquer perdão!
"Cereja", envie-me essa foto, e terei todo o prazer em publicá-la!
Direi eu, que felizmente ainda há nas Caxinas e Poça da Barca, muito
boa gente que sabe falar desta maneira.
Tal como em Miranda do Douro se
procura preservar o Mirandês, pena
é que os responsáveis pela Cultura
desta Terra, não tenham consciência, daquilo que dia a dia estamos a perder...
Ao menos, poderiam fazer algumas
gravações, para legarmos a futuras gerações.
Quanto à foto do casamento conheço-a de algures.
Hoje mesmo inquiri junto do Arquivo
Fotográfico Municipal, que ignora.
Vou indagar.
Cereja
Estive a ler para pessoas que não são do meio exactamente com a fonética do Caxineiro e essas mesmas pessoas não perceberam nada da forma que li. Ri-me bastante ao ler e ri-me principalmente da cara de espanto das pessoas. no fim tive todo o prazer de traduzir. Gostava de ler muitos mais destes textos, a fonética desta que é a minha terra.
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