Falar sobre os nossos estaleiros, torna-se para mim muito dificil.É falar de um assunto que prometi muitas vezer jamais o fazer.É como ter de falar de mim mesmo, expor coisas do meu intimo, coisas que achei dever guardar só para mim.Mas o Fangueiro,a certa altura "mexeu" comigo dizendo que vai fazer um modelo da "Maria Bina". Ele deve ter em sua posse uma estampa por mim realizada em 93 com desenhos pormenorizados desta embarcação.Fui sócio e projectista do estaleiro Samuel, fundado pelo meu Avo em 1935,durante25 anos.Hoje não exerço qualquer actividade relacionada com os estaleiros,mas esta paixão fica em nós para sempre.O ancestral conhecimento que somos portadores e que serviu para Portugal se afirmar ao mundo, corre sérios riscos de daqui a poucos anos se perder para sempre. Os estaleiros foram mudados em 93 para Azurara. Sem esta mudança, não teriam resistido muito tempo. Perdemos a "cascata" mas ficamos com os estaleiros. Para os perpetuar temos a NAU e o BARCO DE PESCA em construção, devendo estes servir de primeiro passo de um projecto para pôr a construção naval Vilacondense no patamar que merece a nivel mundial.Conforme diz Filipe Castro, professor na universidade do Texas,e investigador arqueologo subaquatico, Vila do Conde tem o ultimo reduto deste conhecimento a nivel mundial,devendo concentrar esforços ns sua salvaguarda.Muito mais haveria a dizer,mas este não é o local apropriado lembrar das vozes e movimentos coordenados do pessoal a puxar um toro de varias toneladas,o cheiro a cêbo derretido no pote de ferro,tantas outras coisas, o trabalho da sala do risco,dos rendilhados dos seu traços curvos e concordantes, com os seus virotes,com uma precisão admiravel, um conhecimento de muito poucos e que temo a sua perda para sempre.
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ANTÓNIO CARMO
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7 de Outubro de 2008 11:55
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NOTA - Carmo, para que mais pessoas possam ler o teu comentário resolvi colocá-lo na frente do blogue, certamente me perdoarás.
Obrigado.
12 comentários:
Caro Carioca,
Fico muito agradado por estar a dar valor de "1ª página" a este assunto dos estaleiros e que o Sr. António Carmo perceba a sua "ousadia".
Efectivamente, e com a ajuda de um grande amigo da Damaia, tenho em minha posse o livro "Traineiras" de Octávio Lixa Filgueiras, um autor e investigador dos nossos barcos que muito fez em documentar este nosso passado. Persigo tudo sobre o seu trabalho e tudo, literalmente tudo, relacionado com os nossos barcos tradicionais de pesca e sua construção. A base de dados já é extensa em fotos, textos, desenhos, postais, etc. e presentemente estão dois modelos em construção, uma catraia grande e um dóri dos anos 60.
Fiquei muito contente quando vi no fim deste livro "Traineiras" os planos completos de uma lindíssima traineira... com vela...(com um bonito texto a condizer) como muitas que se construíram em Vila do Conde e presente num filme sobre a Póvoa dos anos 60. Há mais de um ano que procurava dados sobre aquele "estranho" barco a motor no filme com duas forquetas e verga do mastro em cima, do lado de bombordo. "Uma traineira a motor e vela nos anos 60??", perguntava eu. (só nasci em 1975...)
Em breve iniciarei a construção desta traineira, pois para mim representa muito bem a sabedoria de quem construía barcos em Vila do Conde (sem menosprezo aos restantes estaleiros do país). É um barco a motor, dos anos 50 e 60 mas que mantinha a alma da vela. Isto para mim é único e enorme no seu significado.
Teria o maior gosto em trocar imensas dúvidas e ideias sobre os barcos da nossa terra com o Sr. Carmo, ou com os demais, barcos como o "Cego do Maio" ou o "Romar", uma grande traineira que pertenceu aos meus avós e me lembro dela teria eu uns 4 anos, com uma grande popa de leque, julgo que construída em Vila do Conde. Caso prefiram o email num possível contacto, será cachinare@sapo.pt
Um grande obrigado a todos os que se interessam por trazer este passado ao de-cima e ao Carioca que ajuda a divulgá-lo e a puxar à conversa.
www.caxinas-a-freguesia.blogs.sapo.pt
Caro António Fangueiro,vou servir-me deste meio, não sei se um pouco abusivamente,para lhe deixar mais alguns elementos sobre este tema,mas sendo este um tema de todos aqui vai:
De facto a estampa publicada no livro «TRAINEIRAS» do Arq. Lixa Filgueiras, é minha. Ele pediu-me colaboração para o livro, sendo tambem diversos sêlos reproduzidos a partir de desenhos meus.Há muitos elementos descritos que foram fornecidos por mim.
No que toca á MARIA BINA,esta foi construida em 1956 para Vila Nova de Cerveira,tendo muitos anos mais tarde sido abatida á pesca comprada pelo meu pai e tio,sendo transformada na primeira draga em Vila do Conde.Alguns ainda se devem lembrar dela, tinha dois enormes caixotes flutuadores,um a cada bordo.NEste modelo de embarcação, encontro fortes razões para lhe chamar nossa, Vilacondense, sendo esta influenciada nitidamente pelas linhas da lancha do alto,com influencia das embarcações de Vigo e com muito forte influencia dos avanços mais tecnologicos de Peniche, eu considero-a de facto "NOSSA",pois tem uma beleza de linhas,umas proporções e uma harmonia que só aqui foram conseguidas.Praticamente só existiam em Viana Póvoa e Vila do Conde.Apresenta a vela de uma lancha para auxiliar o pequeno motor diesel,que deveria ter uns 25 cavalos,mas tambem para emergencia caso o motor falhasse.Esta embarcação marca uma epoca(decadas 50e60)de transição,da vela para o motor,do fim da pesca á linha,do desenvolvimento tecnologico na detecção dos cardumes e sistemas de navegação e no grande aumento da tonelagem das embarcações de pesca.Encontramos um perfeito exemplar destas embarcações na area do museu, na CASA DO BARCO.
A ROMAR foi construida no nosso estaleiro creio que em 72,conheci muito bem não foi projecto meu, que na altura ainda não desenhava, representou para a epoca um avanço tecnologico muito grande era considerada a melhor embarcação de pesca costeira do Paìs.Foi desmantelada á tres anos.
Atonio Carmo
Entretanto considerem-me á disposição para este interessante assunto.
ATONIO CARMO
Bom dia.
Sr. Carmo, nem imagina como os detalhes que nos está a expôr me são importantes. Irei adicioná-los aos planos do "Maria Bina" para que quando terminado tenha a maior informação possível junto dela. Já agora, lembra-se das cores que tinha?
Estive em Outubro de 2007 em Portugal e vi na CASA do BARCO a pequena traineira a ser construída. Estarei por aí em Dezembro próximo por certo a ver se está pronta.
Quanto ao "ROMAR", como disse antes, teria eu uns 4,5 anos e nunca me esqueci da imponência do barco. Pergunto-lhe, se me puder facultar, tudo o que sabe sobre ele, pois tendo pertencido aos meus avós (já falecidos), é um dos "tesouros de família" que tenho perseguido há muito, mas nada encontrado. Dimensões, aparelho, detalhes e enfim o mais importante, os seus desenhos, são uma ambição minha desde miúdo. Pergunto-lhe como poderei chegar a esses planos e pagarei, caso necessário, por eles.
Atentamente,
www.caxinas-a-freguesia.blogs.sapo.pt
Caro Antonio Fangueiro, aproveitando novamente este espaço, terei muito gosto em ajuda-lo. Quando cá vier em Dezembro procure-me no meu establecimento das bicicletas mesmo em frente á nau.Prometo-lhe os planos da ROMAR. Conheci bem o seu avô, conheço bem o mestre Adriano e o irmão que foi o ultimo mestre do barco.
O meu contacto é
naturbike@gmail.com
ACARMO
olha o pelourinho em frente à embarcação!
Desenho de Artur Guimarães,reproduzida a partir de uma fotografia no "dia do lançamento do lugre TENTADOR em Outubro de 1910
No livro de registo de navios Portugueses de 1926 ,o "tentador", não aparece,mas aparecem vários outros grandes navios construidos em Vila do Conde, entre eles o LIDADOR, lugre construido em 1919,tinha como medidas principais:
-arqueação bruta-497,89 TAB!
-Boca de sinal-10,20m !
-Pontal-4,31m!
-Comprimento de sinal-48,93m!
-O seu comprimento de fora a fora,embora não conste, deveria ser á volta de uns 54-55 metros!
-Tinha 4 mastros.
Teria sido este o maior navio construido em Vila do Conde?
Por comparação veja-se a NAU que tem 27,50 m de comprimento
A CARMO
Boa noite.
Infelizmente de momento a base de dados do Museu Marítimo de Ílhavo está indisponível para confirmar as medidas, mas o lugre "Gronelândia", construído em 1922 com o nome "Viana" também tinha 4 mastros e enormes dimensões.
Fica este link sobre o navio e uma história curiosa sobre o Gomes de Ílhavo... .
Cumprimentos,
www.caxinas-a-freguesia.blogs.sapo.pt
Eis o link:
http://blogdobarco.blogspot.com/2007/10/o-gronelandia.html
Boa Noite Amigos,Fangueiro e TóZé e todos.O estaleiro tém Alma,sim ,más com menos um dos seus braços que eu assim considero,mas isso são outras contas que eu não sei desfiar e como tál respeito ,mas que éra um braço direito ,ninguém tém duvidas e muito menos eu que conheço o meu amigo TóZé.Que prazer me dá encontrar aqui os meus amigos ,eu que nunca me aperçebi ou nunca tinha passado por aqui e por acaso encontro os amigos a falar de barcos e construções que beleza,já agora o carioca da vila ,eu que desconfiava dos traços ,dos conheçimentos ,muita coisa junta só podia ser pessoua com muitos conheçimentos de causa .Um abraço a ambos comprimentos as familias e saudações maritimas.Jaime Pião
Caro António Carmo
Por acaso encontrei o seu blog e entrei e ao entrar e ler o inicio do "Estaleiro tem Alma" recordei-me imediatamente de quando eu pequeno, de meus avós mais de uma vez falarem do Samuel de Vila do Conde, grande homem e amigo, diziam eles quando eu tinha os meus 12/15 anos e lembro-me perfeitamente como se tivesse sido ontem! Tambem meu avô foi construtor naval e sei que trabalhou e foi amigo do seu avô Samuel.
Meu avô, Alberto Gonçalves Pinto da familia dos "calafates" de Viana do Castelo devia ter trabalhado para o seu avô no inicio da fundaçao dos Estaleiros em 1935, julgo eu, porque em 1939 a familia ja estava a morar em Leça da Palmeira e dai mudaram para Setubal onde meu avô teve o seu maior estaleiro naval na década de 40.
Fico muito grato se o António Carmo ou algum dos leitores deste blog tiverem qualquer informaçao mais pequena que seja sobre o Alberto Gonçalves Pinto, que me informem! Qualquer dado, enriquece o historial dos "meus calafates" que dentro dos possiveis estou a construir. No Museu de Arte e Ar queologia de Viana do Castelo existe uma colecçao de embarcaçoes em miniatura da autoria de João Gonçalves Pinto, irmao do meu avô e na Sé Catedral de Viana do Castelo na Capela dos Mareantes existe grande ex-voto de um galeão em miniatura, que consta ter sido enviado de Hamburgo por um mareante vianense do século XVII e reconstruido no fim do século XIX pelo meu bisavô, António Gonçalves Pinto e que demorou cerca de um ano para terminar.
Caso prefiram o email num possível contacto: fmp_lourenco@hotmail.com
Com os melhores cumprimentos
Fernando Manuel Pinto Lourenço
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